Quando eu estava no último ano da faculdade, um colega de turma faleceu. Morreu afogado durante o final de semana na praia. O Gabriel, este era o nome dele, estudava comigo não só na faculdade de Direito, que eu cursava pela manhã, como também na História da USP, que eu fazia à tarde.
Foi um vazio enorme deixar de vê-lo em ambas. Ainda lembro do jeitão do Gabriel, do gatinho que adotara da rua pouco tempo antes de morrer, do nome do gato: Evair, porque assim como eu, o Gabriel era palmeirense. Lembro dele dizendo que queria ir para a Austrália de mochila nas costas. E lembro de ter ligado para a mãe dele, sua família vivia em São José dos Campos, para apresentar meus sentimentos.
Fico triste ao me lembrar do Gabriel, penso em tudo o que ele planejou fazer e não fez,
mas também fico feliz que ele tenha deixado uma lembrança tão boa dentro de mim que jamais o esqueci. E talvez viver eternamente seja assim: através da memória que outras pessoas pessoas tem de nós.
Hoje estourou em São Paulo a notícia de que o Belas Artes, uma das mais tradicionais e antigas salas de cinema da cidade, irá fechar porque o prédio foi pedido pelo proprietário que lhe dará nova destinação.
Para mim, o grande lamento será o fim da opção de um cinema com filmes de artes, alternativos e fora do circuito comercial, mas sinceramente as instalações do cinema eram péssimas: corredores apertados, salas ruins com som idem, sem nenhuma acessibilidade. Definitivamente, é um cinema que nasceu a 70 anos atrás e não se modernizou nada desde então.
No twitter, o termo 'Belas Artes' chegou ao trend topics mundiais, em outras palavras, foi um dos 10 assuntos mais citados no mundo todo.
Mas não passará desta marca, não haverá mobilização na porta do prédio, abaixo-assinado para o prefeito salvar o cinema. A militância hoje fica sentada no sofá, azar do Collor que foi presidente em uma época que estudante ia pra rua, nos dias de hoje ele terminaria seu mandato apenas impopular nas redes sociais.
Os fabricantes das pulseiras PowerBalance, após pressão dos órgãos de defesa do consumidor na Austrália,
confessaram o que qualquer pessoa com bom senso já sabia: que as pulseiras não possuem poder algum para ajudar no equilíbrio, que não passam de um golpe. Claro que tudo era muito bem feito: diziam que a pulseira possuía um holograma que aumentava o equilíbrio das pessoas, aqui um
vídeo demonstrando como faziam a apresentação do produto [aqui outro
vídeo, desta vez demonstrando o truque por trás do vídeo da powerbalance], ou seja, usavam um discurso pseudo-ciência para vender um produto que não trazia benefício algum, puro efeito placebo.
O que o fabricante da powerbalance fez é o que no meio científico recebe o nome de impostura científica: usa-se de argumentos científicos para vender uma ideia [ou no caso um produto], mas não se aceita a verdadeira ciência para testá-lo, afastasse a ciência 'pura' com argumentos irrefutáveis baseados em premissas falsas. Não é o primeiro nem será o último caso, infelizmente. O impostor científico ama a mídia e o brilho dos holofotes e flashs com na mesma proporção que a verdadeira ciência os evita. E os evita porque a ciência está sempre buscando, jamais dá algo como esclarecido, tudo, tudo mesmo, está sujeito à experimentação.
Um exemplo recente de impostura científica é a alegação de Lillian F. Schwartz de que o quadro Mona Lisa seria na verdade um auto-retrato de Da Vinci.
Muito se especula até hoje quem teria sido a modelo do mais famoso quadro de Da Vinci [e do mundo]. A tese mais aceita é de que se trata da mulher de um rico comerciante de Florença: Lisa del Giocondo. A primeira pista para indicar que esta mulher está retratada na pintura são os dois nomes pelo qual a obra é conhecida 'La Gioconda' e 'Mona Lisa' [Mona é contração de madame no italiano arcaico]. Corrobora esta ideia uma nota do biógrafo de Leonardo sobre um quadro encomendado por Giocondo que jamais foi acabado. Da Vinci manteve a pintura consigo por toda vida, alterando-o sempre, o que leva alguns a especularem que talvez a figura ali representada seja sua própria mãe. Schwartz pegou um desenho de Da Vinci, um auto-retrato, e traçando as proporções deste desenho com o quadro, chegou à conclusão que ele se auto-retratou. Primeiro: não há prova de que o auto-retrato seja dele próprio, acredita-se que seja dele, simplesmente não se pode pegar uma suposição e usá-la como premissa, mas ela o fez. Segundo ponto: não ocorreu a Schwartz em momento algum que as proporções utilizadas no quadro por Leonardo eram as que ele melhor conhecia, por serem as suas e ele as ter estudado minuciosamente. Ou seja, ele sabia que com aquelas proporções o quadro teria uma forma humana crível, ainda que não a da modelo. E por último: o quadro foi repintado e retocado inúmeras vezes, o que pode ter alterado suas proporções. Fora que é pouco provável que Leonardo imaginasse que usa obra ficaria legada para a posteridade, então a tal piada interna que lhe atribuem, perde-se.
A ciência responde uma série de questões, deixa em aberto tantas outras.
Mas, por prescindir de explicações mágicas ou fantásticas, carece do sucesso da pseudo-ciência.